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quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Escolas com Nomes de Militares Pode Mudar no Rio e na Bahia

Por Stella Rios




Uma eleição escolar pode decretar uma ironia histórica: o nome do ativista político Carlos Marighella (1911-1969) poderá batizar uma escola em substituição ao do ex-presidente general Emilio Garrastazu Médici (1905-1985). Os alunos do colégio estadual, no bairro do Stiep, na orla de Salvador, realizaram a votação esta semana. Já no Rio, por iniciativa da Comissão da Verdade do Rio, e com a colaboração das secretarias estaduais de Assistência Social e Direitos Humanos e de Educação, a Escola Estadual Presidente Costa e Silva, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, terá seu nome mudado para Abdias Nascimento. A cerimônia que marcará a adoção do novo nome será amanhã à tarde.
Marighella ficou em primeiro na eleição da escola baiana, com 406 votos, e o geógrafo Milton Santos em segundo, com 128. A secretaria estadual de Educação informou nesta quinta, contudo, que ainda não foi comunicada, oficialmente, pela direção da escola sobre a pretensão da mudança do nome e tampouco o resultado da votação. Quando isso ocorrer vai decidir se troca o nome.


A ironia histórica de uma eventual mudança de nome é porque Marighella, líder da luta armada por meio da Ação Libertadora Nacional (ALN), foi morto na repressão aos opositores da ditadura militar exatamente quando Médici era o presidente do Brasil.
- Mudar o nome da escola é um anseio antigo, principalmente dos professores da área de Ciências Humanas, como Filosofia e História. Este ano, resolvemos levar o projeto de mudança de nome à frente - explica Aldair Dantas, diretora do Colégio Médici.
Fundado em 1972, o colégio tem cerca de mil alunos e oferece cursos do ensino fundamental, a partir da 6ª série, ensino médio e formação profissionalizante. A votação começou no início de dezembro com os pais dos alunos. Depois votaram alunos e professores. Além de material produzido pelos alunos, como vídeos e exposição, a escola programou palestras sobre os perfis de Marighella e Milton Santos.


Se a ideia partiu da escola, pelo menos o debate sobre o golpe militar e seus desdobramentos está sendo estimulado pela Secretaria de Educação por meio do projeto "Ditadura militar - Direito à memória, 50 anos do golpe de 64", lançado em julho deste ano. A reportagem procurou o Ministério da Defesa, por meio da assessoria de comunicação, para falar sobre a mudança e a preservação da memória de generais que foram presidentes durante o regime militar, mas até o fechamento desta edição não houve retorno.
Autor do livro "Marighella: o inimigo número um da ditadura militar", o jornalista e escritor Emiliano José, ex-deputado do PT, elogia a iniciativa:
- O ideal é que a escola ficasse com o nome tanto de Marighella como de Milton Santos. Como não é possível, eles já merecem parabéns pela beleza de iniciativa.

Antropólogo e ex-preso político, Roberto Albergaria elogia a iniciativa, mas alerta para o que considera risco de invisibilizar a participação de civis no sistema ditatorial.
- Não se pode concentrar todo o mal na figura dos militares, pois grandes medalhões da política e da intelectualidade baiana compactuaram com eles para manter seus privilégios ou se omitiram - afirma.
Albergaria foi militante do Partido Comunista Revolucionário (PCBR). Em 1974 foi preso. Estudante universitário na época, passou seis meses preso e seis anos respondendo a processo:
- Nesse período, não consegui emprego e nem mesmo a carteira de habilitação. Era um terrorista e comunista, o equivalente a um pária na época.
Homenagem a lider negro

O processo de mudança do nome na Escola Estadual Presidente Costa e Silva começou em agosto deste ano, quando a Comissão da Verdade do Rio deu início a uma discussão com alunos e professores da escola, o que culminou com uma votação entre eles para a escolha do novo nome, Abdias Nascimento. Fundador do Teatro Experimental do Negro e o primeiro deputado federal a dedicar seu mandato à luta contra o racismo, Abdias foi também senador e, no governo fluminense de Leonel Brizola, ocupou a Secretaria de Defesa e Promoção das Populações Afro-Brasileiras do Estado do Rio de Janeiro.

A CEV-Rio será representada na cerimônia de mudança de nome, marcada para às 15h na escola, pelo seu integrante Geraldo Cândido. Está prevista, também, a presença dos secretários estaduais de Direitos Humanos e de Educação.
Oglobo

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