Por Stella Rios
Criticadas, mal compreendidas e mal faladas. Obras de arte com viés erótico costumam ser vistas como mera pornografia e levam um longo tempo para ter seu valor reconhecido. Porém, o erotismo na História da Arte tem uma função: retratar a relação entre o homem e a sua identidade. “De uma forma geral, a arte fala do momento que a gente vive, inclusive a erótica. A arte feita em cada época fala da nossa relação pessoal, tanto do artista como da época, com o corpo, com desejo e com a nossa forma de encará-lo”, explica a professora de História da Arte Fal Vitiello de Azevedo.
Longe de representar apenas o sexo e a luxúria, a arte erótica também identifica os ideais de perfeição de cada momento. “No erótico há uma preocupação em mostrar o ser humano como a natureza o criou, em alguns momentos focando essa questão do desejo, e em outros não. Na Grécia, mostrar o nu era também revelar um ideal de beleza, e não valorizar o erotismo. Em Roma, algumas obras eram a exacerbação do desejo”, explica o professor de História da Arte da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Isaac Camarg
As manifestações eróticas fazem parte da história de todos os continentes, em todos os tempos. No Japão, um modelo de gravuras muito famoso durante o período feudal foi o Shunga, cenas sexuais eram em quadros de madeira, feitas pelos mesmos artistas que utilizavam a técnica Ukiyo-e – a gravura japonesa característica.
No Peru e nas comunidades pré-colombianas, esculturas eram feitas representando atos sexuais dos mais aos menos convencionais. Até mesmo no Egito, em papiros utilizados para representar a organização da sociedade faraônica, havia espaço para o erotismo sexual. “Desde muito cedo há um encantamento com a criação. É essa arte fálica, essa primeira representação do sexo e o encantamento pela própria capacidade de nos reproduzir”, comenta Fal.
Essa produção erótica, no entanto, sofreu uma interrupção durante a Idade Média europeia. A influência da Igreja fez com que os artistas deixassem de produzir tanto conteúdo erótico. As consequências dessa repressão, porém, foram intensas. “Depois da Idade Média, no Renascimento, há um enaltecimento da sensualidade proveniente da menor repressão da religião na cultura. Na Antiguidade clássica em Roma, há manifestações eróticas e radicais. Depois, isso desaparece. Nesse contexto, o erótico some e volta a aparecer com tudo”, diz o professor Camargo.
O caráter libertário marcante nesse ressurgimento erótico invadiu não apenas esculturas e telas, mas também livros, gravuras e danças. Muitos artistas, como Peter Paul Rubens, trouxeram elementos clássicos de volta, como a lenda grega de Leda, a rainha espartana fecundada por um cisne – disfarce de Zeus para cobiçar (e possuir) a mulher do próximo.
Com o surgimento da fotografia, no século XIX, o erotismo foi a obra-prima para novos caminhos de ousadia e inovação dos artistas. “Em arte, tudo que é novo causa espanto e escândalo, envolva sexo ou não”, compara Fal de AzevedoHoje em dia, o sexo se infiltrou em outras formas de expressão artística, desde pinturas com nanquim a chocolates produzidos em massa. A artista francesa Apollonia Saintclair, considerada herdeira do desenhista italiano Milo Manara, cria imagens com muito erotismo e sexo explícito. E a empresa Edible Anus criou uma iguaria particular: um chocolate puramente belga, no formato do ânus de uma modelo.
Ultrapassar barreiras, quebrar paradigmas e surpreender o comum também é missão da arte erótica. E, ao contrário do que se imagina, a liberalidade dos costumes não torna nada mais fácil. “Em uma sociedade em que tudo está erotizado, a arte não ganha mais tanta ênfase. Ela já faz parte do nosso cotidiano, da publicidade às novelas”, acredita Isaac Camargo.
IG
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